Balsa atinge embarcações em Manicoré e moradores denunciam abandono: “Nada mudou desde a tragédia”
Por Fato Amazônico -20 de maio de 2025
Na madrugada desta segunda-feira (19), por volta das 4h, mais um grave incidente envolvendo balsas desgovernadas foi registrado na região de Manicoré, no sul do Amazonas. A embarcação atingiu três balsas de garimpo ancoradas na comunidade Nova Catarina, causando prejuízos materiais e renovando o sentimento de insegurança de moradores que vivem à beira do Rio Madeira.
Entre os que escaparam da tragédia estava Evair Lagos, que em janeiro deste ano perdeu a esposa e os três filhos em um acidente semelhante, na comunidade de Urumatuba. Desta vez, Evair por pouco não se tornou novamente vítima de uma colisão causada por uma balsa descontrolada que seguiu viagem sem prestar socorro.
Segundo relatos, a embarcação destruiu canoas, motores e por pouco não atingiu novamente os flutuantes onde dezenas de famílias vivem. Moradores, em desespero, usaram voadeiras para afastar suas casas flutuantes da rota da balsa, evitando mais uma tragédia.
Moradores clamam por fiscalização e segurança
A professora Leidiane Oliveira, moradora de Urumatuba e tia de Talita Ferreira Lagos, uma das vítimas fatais do acidente de janeiro, critica duramente a falta de ação efetiva da Marinha do Brasil e das autoridades competentes.
“Não sei de onde saem essas balsas sobrecarregadas. Desde a tragédia, já ocorreram inúmeros incidentes. Oito dias depois da morte da Talita e dos filhos, outra balsa quase atingiu um flutuante. E continua tudo igual. Falta compromisso, fiscalização, um olhar mais atento antes que outra família sofra como a nossa”, desabafa.
Leidiane relata ainda que o trecho onde vivem, marcado por curvas e proximidade com o leito do rio, representa uma ameaça constante, especialmente em épocas de cheia, quando as comunidades ribeirinhas ficam ainda mais vulneráveis. Segundo ela, o comportamento negligente de comandantes e a sobrecarga das embarcações são riscos reais à vida.
“Está ficando perigoso demais. O que falta acontecer para que se tomem providências? Quando houver outra tragédia, aí vão querer mandar Marinha, governo federal, mas será tarde demais. Somos sempre os mais fracos nesse sistema”, lamenta.
Moradores das balsas atingidas chegaram a invadir o rebocador da embarcação que causou o acidente e tentaram agredir o comandante, revoltados com a situação e a falta de responsabilização.
Relembre o caso de janeiro
No dia 17 de janeiro deste ano, uma balsa carregada de soja colidiu com casas flutuantes na comunidade de Urumatuba, também em Manicoré. Quatro pessoas da mesma família desapareceram. O corpo da jovem Talita Ferreira Lagos, de 22 anos, foi encontrado dois dias depois. Seus filhos — Thalia, Isadora e Everson, todos menores de idade — seguem desaparecidos.
Após uma semana de intensas buscas, a Marinha do Brasil anunciou, no dia 24 de janeiro, a suspensão das operações de resgate no município de Manicoré, no Amazonas, onde um trágico acidente resultou no desaparecimento de três crianças.
As investigações foram abertas, e as buscas tiveram apoio da Marinha e de moradores, mas até hoje não houve responsabilização pública dos envolvidos na tragédia.
Medo cotidiano e impunidade
O cenário que se repete revela não apenas falhas operacionais, mas uma crise de fiscalização e ausência de políticas públicas de proteção às populações ribeirinhas. Enquanto grandes embarcações trafegam livremente com cargas pesadas, comunidades inteiras vivem à mercê da sorte — com medo de dormir, de ver suas casas levadas pelo impacto e suas vidas ceifadas sem qualquer aviso.
Moradores agora pedem urgência na regulamentação do tráfego de grandes balsas no Rio Madeira, fiscalização efetiva da Marinha e punição exemplar aos responsáveis pelos constantes acidentes.
A reportagem do Fato Amazônico entrou em contato com a assessoria do 9º Distrito Naval da Marinha do Brasil, localizado no Centro de Manaus, para que se manifestasse a respeito das denúncias dos moradores sobre a falta de uma fiscalização mais efetiva e de punições exemplares por parte do órgão. Até o fechamento desta matéria, no entanto, não obtivemos resposta. O espaço segue aberto para esclarecimentos.
Por: Fato Amazônico
Portal Manicoré em Foco